7.26.2006

O amor é uma uva roxa

Quinta Conversa


Vida: Qual a pior coisa que pode acontecer com alguém?
Gafanhoto: Viver.
Vida: Por que viver é a pior coisa?
Gafanhoto: Ter que carregar o peso da existência.
Vida: Explica.
Gafanhoto: Porque a morte é o nada e o nada é incolor, indolor, inodoro. Mas, viver é não ter vergonha de ser feliz. É cantar e cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz...
Vida: Na medida em que aprendo, significa que posso tornar a vida melhor?
Gafanhoto: Quanto mais se aprende mais se tem acesso ao imponderável e ao peso do mundo. Quanto mais se sabe, mais puto com a humanidade o cara fica.
Vida: Seria o pesa das descobertas?
Gafanhoto: O peso da procura dói muito mais. O cara que procura, acha e achando está comprando briga. Mas tudo isso pode ser ultrapassado. Por isso foi criado o vinho e as canjiquinhas.
Vida: Mas será que tudo passa?
Gafanhoto: Dizem. Mas eu não disse que passa, falei em ultrapassar, são coisas diferentes.
Vida: Tudo bem. Mas não dizem também que sempre fica alguma coisa? Se fica alguma coisa, então, nem tudo passa? E aí?
Gafanhoto: Se a dor for grande você esquece estas filosofias. Fica a dor, mas você a pode ultrapassar, mas não há como não passar por ela.
Vida: O que fazer?
Gafanhoto: Reverter o que de ruim ficou em aprendizado.
Vida: Mas a dor não diz tudo, diz?
Gafanhoto: Não, porque ela gagueja e não ouve muito bem.
Vida: E agora, o que fazer?
Gafanhoto: Viver. Representar um personagem no grande teatro uma única vez, sem aplausos.
Vida: Vamos devagar, vê se entendi direito, quando estou com dor não escuto, não falo e não penso direito. É isso?
Gafanhoto: É, a dor entorpece os sentidos.
Vida: E como sair dessa?
Gafanhoto: Pedindo ajuda. O maior erro é querer conduzir o processo com as próprias mãos e sozinho, ninguém dá conta disto sozinho. Precisamos assumir este fato. Quando nos pomos a caminhar sozinhos, o sofrimento, a dor só faz aumentar. Claro que chega um momento em que ela pára, mas aí já estamos derrotados.

O amor é uma uva roxa

Quarta Conversa


Vida: Tem um tempo?
Jornalista: Uns 5 min.
Vida: Então responde uma pergunta.
Jornalista: Fala.
Vida: Qual a pior coisa que pode acontecer com alguém?
Jornalista: Essa pergunta é difícil. Vai do que cada um considera importante, eu acho. Há coisas que acredito que quando perdemos nos abala muito. Posso citar, por exemplo, a perda da vontade de viver, a perda da fé, a perda da saúde, a perda de alguém. As perdas, o difícil está geralmente ligado às perdas.
Vida: É sempre difícil perder algo. Mas o que é viver?
Jornalista: É perder, ganhar, conquistar, sei lá.
Vida: Como se perde a fé?
Jornalista: Bem... se alguém acredita em Deus e deposita todas as expectativas Nele e de repente, perde um filho, por exemplo, a fé, se não for muito forte, pode ser abalada
Vida: A saúde é tudo?
Jornalista: Vai do ponto de vista de cada um, pra mim é muita coisa.
Vida: Quando falamos de pessoas, qual a pior das perdas?
Jornalista: Também vai de cada um, pra mim, qualquer pessoa da minha família. Pra outro pode ser um filho, um marido, um amigo. Depende muito de quem está perto ou de quem está longe. Esse lance de distância deixa os laços meio diferentes.
Vida: Você acha que a distância muda a relação?
Jornalista: Sim. E acontece algo incrível, as vezes ficamos mais próximos.
Vida: Explica um pouco essa relação com a distância, o quanto a distância pode aproximar.
Jornalista: Hum.... Acho que, talvez, o que era expresso com a presença física tenha dado lugar às palavras e talvez as palavras sejam mais diretas e indicam o que a pessoa realmente quis dizer. Sei lá, é algo estranho, tenho pessoas queridas que se encontram distantes e hoje converso mais com elas e sobre coisas que não conversávamos quando estávamos morando na mesma casa. Preocupamos-nos mais em saber como a outra pessoa estar.
Vida: Deixa ver se entendi direito: com a presença física nós deixamos de lado algumas coisas por acha que só a presença já é suficiente.
Jornalista: É isso, eu acho.
Vida: Isto é muito louco, não? Na falta do corpo do outro, tentamos substituí-lo com palavras.
Jornalista: A gente vive neste mundo louco mesmo, também acho esquisito.

O amor é uma uva roxa

Terceira Conversa

Vida: Qual a pior coisa que pode acontecer com alguém?
Observador: Viver sem amor a vida toda e o resto da vida.
Vida: E como posso definir ou experimentar o amor?
Observador: O amor é como uma uva roxa. O amor é a experiência da aceitação mútua entre duas pessoas, com o projeto de assim permanecer. Aceitar alguém é querê-lo como ele é. Para saber como alguém é, é preciso conhecê-lo. O amor, portanto, é a experiência do mútuo conhecimento. Não conhecer completamente é um convite para mais explorações.
Vida: Há limites para isso?
Observador: Sim, porque todo excesso é perigoso.
Vida: Há amor sem luta?
Observador: Não, nem com violência.
Vida: Toda luta tem que ser violenta?
Observador: De jeito nenhum, julgo, não sei ao certo.
Vida: É possível viver o amor como uma forma de arte?
Observador: Dizem, mas o que seria arte? Porque não viver o amor como uma forma de amor?
Vida: Amor pelo amor? É possível? Não existe em nós o desejo de determinar o outro?
Observador: Todos queremos dominar um ao outro, logo, o amor, que é certo desejo de dominação, pois que é uma forma de conhecimento, que é uma forma de dominar, requer um trato, um acordo subliminar, o de que cada um procurará dominar o menos que puder.
Vida: Existe um jogo de interesse atrelado, eu perco aqui para ganhar ali?
Observador: Isso.
Vida: Amo mais quanto mais o outro se submete?
Observador: Não, amo mais quanto mais o outro não se deixa submeter, porque assim aumento minhas investidas. O amor é o que fica, o que sobra, o resto entre o desejo de dominar e a resistência alheia em ser dominada.
Vida: Vejamos um exemplo: quando perco um amor o que dói não é exatamente a falta daquilo que se dominava?
Observador: Não, o que dói é a falta da relação?
Vida: Falta da relação ou da relação de dominação?
Observador: Acho que isso depende de quem responde essa questão
Qual o melhor: Qual o melhor, dominar ou ser dominado?
Observador: Depende de cada um. Para mim, é dominar, mas sempre na possibilidade de que o outro resista com doçura.
Vida: E o que dói mais numa relação?
Observador: É o próprio relar. Toda relação é uma forma ralação.
Vida: O que é inútil numa relação?
Observador: Inútil é esperar que o outro adivinhe seus pensamentos.
Vida: O pensamento não comunica.
Observador: Pois é.
Vida: Isso dói.

Observador:...

O amor é uma uva roxa

Segunda Conversa


Vida: Qual a pior coisa que pode acontecer a alguém?
Estranho: Ser impossibilitado.
Vida: Ser impossibilitado de agir conforme suas próprias determinações?
Estranho: Ser impossibilitado. Ponto. O resto são detalhes.
Vida: Entendo.
Estranho: Cada impossibilidade representa uma restrição naquilo que nos torna humano: o homem é humano na medida em que pode expressar-se enquanto tal.
Vida: A pior coisa, então, não série ele descobrir que não é aquilo que pensa que é?
Estranho: Não, de jeito nenhum, essa talvez seja a melhor coisa.

O amor é uma uva roxa

Primeira Conversa


Vida: Qual a pior coisa que pode acontecer a alguém?
Princesa: Deixar de ser ele mesmo.
Vida: Explique mais.
Princesa: Deixar de ser o que se é, perder ou camuflar sua individualidade, suas vontades, seus desejos, sei lá, deixar de ser ele mesmo.
Vida: Não é isso que acontece muito nas relações dos sujeitos?
Princesa: É, mas sempre existe um jogo de interesse atrelado, eu perco aqui para ganhar ali, mas se acontecer uma anulação total essa pessoa não pode estar bem nessa relação, até concordo com o "ceder" como uma questão de conviver bem, no entanto, se perder por completo, não.
Vida: Há amor sem luta?
Princesa: Essa é difícil. Acho que não.
Vida: Explica
Princesa: Fala de amor no geral ou entre homem e mulher.
Vida: Agora me pegou. Vamos para o básico. Fiquemos com homem e mulher.
Princesa: O que é o básico?
Vida: A relação a dois, para não ir muito longe.
Princesa: Não, pois não é uma mágica, é algo que tem que ser construído, logo implica em luta, em "sofrimento", coisas do tipo.
Vida: Não existe em nós o desejo de determinar o outro?
Princesa: Sim. Só que no "jogo" temos que "saber jogar" e acho que esse é exatamente o ponto, são muitos sentidos envolvidos e esses fazem com que cheguemos a esse estado.
Vida: Alguém me falou que o amor é a experiência da aceitação mútua entre duas pessoas, com o projeto de assim permanecer, concorda?
Princesa: Permanecer enquanto durar e para que isso aconteça requer um exercício de ambos.
Vida: E como posso definir ou experimentar o amor?
Princesa: Poxa, essa é fogo. É uma coisa que não tem resposta concreta, pelo menos para mim, pelo menos até este momento.
Vida: O amor não seria certo desejo de dominação?
Princesa: Pode ser. Quando alguém perde o amor de outro podemos observar isto. Muitos quando perdem um amor choram por aquilo que deixaram de dominar. Quando se perde um "amor" o que fica é essa falta de algo que se dominava.
Vida: Amo mais quanto mais o outro se submete?
Princesa: Nem sempre. Existem situações que sim, mas nem sempre é assim.

7.24.2006

Afirmações à sombra da videira

;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Da espera

É preferível o cansaço e a dor da luta
ao cansaço e a dor da espera.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Dos sofrimentos

Os sofrimentos mais inúteis
nascem da presunção de salvar o mundo.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Da bondade

A bondade é incompatível com a vida.
Só apodrecendo posso ser bom.
Logo, sou podre.
E ao apodrecer passo da uva ao vinho.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Do olhar ou do erotismo básico

Olhar é bom, mas nem tanto,
Melhor a vertigem.

Olhar é bom, mas nem tanto,
Melhor o amasso – ritual de carícias.

Olhar é bom, mas nem tanto,
Melhor degustar o corpo.

Olhar é bom, mas nem tanto,
Melhor língua na língua – verbo de ação.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Da falta do afeto

Se não há afeto nada se sente, a vida é alívio.
Daí, não é a falta de afeto que mata, mas sua presença não afirmada.
É a sua não afirmação.
O afeto tem que ser afirmativo, expressar uma potência de vida.
Ele é experimentação e não objeto de interpretação ou de contemplação.
Se assim não for, aí sim, ele nos mata.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Da impossibilidade

Não poder, é foda.
Não foder, é podre.
Não apodrecer, é fogo.
Não se afogar, é pena.
Não penar, é ilusão.
Não se iludir, é luta.
Não lutar, é luto.
Não jogar, é sina.
Não vibrar, é agrura.
Não pulsar, é vinagre.
Não vinagrar, é vinho.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Como cacho

não sei
não sabes
no sabre dessa areia
somos veias
rumores
vezes mil ventos vagos
e mil dissabores
sabores uva, vinho, vinha, vem
vinharemos feito cálices
tocar-nos-emos feito taças
e nos calaremos depois
e nos colaremos depois
tal qual uvas verdes
ou copos depositados no chão
ou corpos suados na cama
ou dedos cruzados na mesa
ou meias trocadas ao sair






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
O outro sou eu

eu não sou eu senão no outro, que não me ignora a si
que somos dois
que somos mais
se sou dois com o outro somos quatro
que somos tantos e tontos e destampos
e de quatro somos oito
e no coito, biscoitos para todos os azares
afoito pelos prazeres
dizeres que não me cabem
afagos que me completam ao desmembrar-nos
fazendo-nos nus de pele





7.23.2006

Como duas uvas verdes

;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Uvas verde(s)

Os gestos verde(s) dos olhos
Cerram o dialogo.
O azinhavre da distância ruge.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Afeto feito de barro

O meu afeto é feito de barro. E cozido.
Se não for feito de barro
o meu afeto,
se não for assim,
não é nada, de nada serve.
Deverá ser feito de barro
o meu afeto.

Afeto
não têm vida própria,
serve apenas.É escada, tijolo, panela, muro, estatua.
Afeto, eu tenho que tocá-lo para que exista.
Eu não o sinto apenas na alma, sinto-o também na pele.
Se não sentir a minha pele suja de barro
a vida não executou,
o afeto não aconteceu.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
A Lembrança

Ter a pele marcada
Enquanto pele tiver
Balança desequilibrada
Que pesa o que nunca é






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
A Dor

Relógio cego apertando nós.
--Por favor, acendam rápido as luzes,
Quero ver o tempo passar!





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
A Saudade

Fogo brando amolece o aço
Vai de ponta a ponta entre os abismos
Construindo pontes de ponta cabeça
E num abraço vai embora

7.21.2006

Bagaço de uvas

;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Refém

Um gesto maldito
No valor de certos prazeres
Um segredo que pode te curar
--A tua causa é perdida, não mais existe resgate.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Caos

Os passos não conseguem ver as pedras.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Constatação

Os dias me alimentam
É tempo
de derramar pela boca, não sei,
talvez as fibras feitas de manhãs.
É, é tarde.
Já é tarde.
Percebo bem, é o inferno.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Determinação

O tempo é pouco
Felicidade com “ph” não existe
--Talvez se eu soltasse um sorriso este pássaro voasse
Mas sorrir com “z” ou sorrir com “s”?
Por fim, só me resta enfiar o dedo na tomada.
Tomar um “xoque” com “x” e que este raio me parta ao meio.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Conquistas e conseqüências

Nos meus desvios de fé comecei a ser punhal enquanto a lama me engolia, várias vezes me pus de pé no quintal, esse oratório desajeitado de conforto que fiz apenas por capricho.

Tudo que foi troféu, hoje me engasga a garganta.

Já fui setenta, hoje sou borrão.

Do sangue que derramei já não me resta mais nada.

Nas varias vezes que morri apenas por capricho, descobri que não adianta guarda na memória a planta da casa, o mapa do tesouro, a bússola do tempo, que ninguém pode está em dois lugares ao mesmo tempo,que ninguém pode vencer o tempo, que ninguém pode construir a maquina do tempo (o cientista louco foi internado no sanatório), que ninguém pode fugir de ser múmia, de ter múmias dentro de si - só que eu não vou desenterrar as minhas, que os arqueólogos desenterrem as suas, as minhas, que fiquem lá, eternizadas embaixo da terra que sou).

É, eu aprendi, e é assim, de vez enquanto nosso álbum de fotografias encontra-se cheio de fotos inúteis e vemos no céu estrelas que não fotografamos.

Hoje eu não espero ver roseiras na minha janela, nunca plantei roseiras. Nem espero que nenhuma porta mágica abra-se na minha frente. Todo dia eu tenho que limpar a jaula do leão, eu tenho que acender a luz para trocar de roupa, nem fico inventando muros com vidros para deixar de viver. E grito para que me escutem: nenhuma utilidade tem em cuspir no chão dizendo que assim serei feliz, que o amor que dediquei, a gratidão que tive, a fidelidade, a lealdade, foram as provas de minha dignidade para com os outros, enquanto em outros momentos serviram apenas como justificativa para as minhas próprias decepções, a minha própria fraqueza. Grito mais: que hoje sou contra aqueles que dizem que tudo tem seu preço, já que muitas coisas faço sem que tenham valor algum.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
A espera

...as mesmas coisas que nunca são feitas...





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
A Ironia

O requentado já não tem o mesmo gosto.





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Existencialismo

Falta-me o alívio
De um dia sem quereres.
Tua cor em mim navalha.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Efêmero

Num céu de pavor escarlate
Desnuda pomba mergulha
Sonhos nas pedras






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
The end

Deixar as soluções
entre paredes de madeira
perder o espírito.

7.18.2006

Suco azedo

;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Fogo-fátuo

Um pão cego em mergulho
Numa travessa de vinho.
Teu nadar me empresta a fome.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Conselho criado-mudo

Nas gavetas
Buscar o equilíbrio nas roupas não põe sereno

Nas estantes
O sereno, para ser sereno de uma sala
Num contexto de símbolos virtuais, é ferimento mudo
A realidade é virtual nas bocas fazendo modelos

Nas camas
É vendível a vontade dos homens
E consumível a psicologia do equilíbrio
O absurdo não se vende em fábricas de equilíbrio






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Sobre a graça

O laço na praça medida
O resto de ponto em cego olhar
As feridas que mudam as nossas verdades






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Pássaro de pedra não voa

Procurar penas para asas
Juntar pedras para montanhas

Se pedra,

ficar
Se asa,

quebrar os limites dos signos externos do desprezo

E como colecionador de trapos
Senta juntando pedras para as asas






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
O Colecionador

O pássaro na gaiola. Mas a gaiola não é o pássaro.
O tolo cuida da gaiola, e o pássaro passa fome.

As penas ele junta como se pudesse recolher a liberdade fingida,
mas preso permanentemente no presente, rumina os dedos na memória.
E o pássaro,
com um cantar demente desata seu coração de inverno
confirmando que tudo aquilo era loucura.






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Dialogo da infrutificação

(nas feridas reinam os vermes, por quem lutas?)
(a mediocridade fede nas bocas das pessoas cheirosas)






;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
O espírito do tempo

existem muitas coisas que é preciso não saber mais







;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
O valor das coisas

Ela foi contra aqueles que diziam que tudo tem seu preço
Pois descobriu que muitas coisas fez sem que tivessem valor algum.

7.15.2006

O Vinho e a Sede

;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Perto

De ti o que em mim
muda abotoando as
sementes do bem viver
é esse desfazer-me sopro
para poder entrar em tua
garganta dizendo segredo

De ti o que em mim
muda escalando o céu
removendo pedras
vibrando folguedos de
esperança é o devir perto




;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Vontade

os músculos explodindo sombra em mim teu corpo chama a mão tateia a inexprimível sensação de espaço em ti para onde for tu me navegas os músculos explodindo sombra em mim teu corpo chama a mão tateia a inexprimível sensação de espaço em ti para onde for tu me navegas





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Altriz

é saboroso hospedar-me nas lembranças do teu gosto
ou nas labaredas de tua substância: minha nutrição





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Milagre

Nos desvios do tempo
o céu guarda súbitos caprichos.
Milagre em mim: tu-eu me existe.





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Grito/nome

Durante o tempo de silêncio eu me guardei
Guiei meus versos para flancos indistintos
Hoje que o devir me guarda
O silêncio se fez festa
A vida se fez sereno vivendo puro grito
E assim de um grito/nome meu corpo alma espaço se transfigura
E em extrema paz onipotente
És minha linda que nos altares da face do momento
Tua ternura branca e leve veste fogo para regar-me a vida





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Por graça tua sou maior que o mar

O mar salgadamente chora e lamenta

se movimenta como quem perdeu

o maior dos tesouros

arrasta seus cabelos algas pela areia

como quem se curva implorando a

volta do bem amado

a noite, enfeita o céu com estrelas

como quem oferece pedras

preciosas

pobre mar tão grande, imperioso

sente-se infinitamente pequeno

sua cabeça de espumas se afoga

entre as pedras

e em dilúvio suicida-se diariamente

sabendo pois que tu és minha

para graça minha, não és sereia

ele, o mar, nas águas sem te ter,

não é ninguém.





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
E

o instante mais precioso

o meu tesouro

recanto macio, fina areia

onde, longe de qualquer deserto

me sinto teu bem

abraço bem amasso

a noite, enfeita o meu céu, és minha

colisão

como quem oferece pedras

preciosas

dá-me teus beijos

eco incontido de furor

crescido

de mulher pele espumas

cujo nome em mim é lei: lascividade

e

sabendo pois que tu és minha

para graça minha, tenho...





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Cantiga flor na flor

Tua pele em lava em mim
- na dança
Nós, lâminas cortantes,
- marfins
É fogo que queima a carne
Cheiro diluído no ar
- incenso
Inflamando tato, paladar, olfato
- incêndio
Minha boca a te beber os seios
e a degustar o leite
- sentido
Gestos teus, harmoniosa dança
E na perigosa harmonia dessa dança
Cada um de nós
se lança
No infinito abismo flor da flor do outro





;;;;;;;;;;;;;;;;;;;;
Cantiga para os teus beijos

Gosto dos beijos,
são beijos arquigostosos.
Não são beijos que eu possa encontrar
em qualquer uma a qualquer hora.
São beijos de mar,
que transforma o eu areia.
São beijos de chuva,
inundando o eu lavoura.
Quando estou em perigo eles me salvam.
São beijos super-héroi,
Que me tiram do abismo.
Gosto deles,
Beijos passarinho,
me fazem voar livre,
em nuvens beijomacias.
Quando estou cabisbaixo,
são beijos de ponte,
ajudam-me a ultrapassar meus limites,
dando-me coragem para pedir mais beijos